segunda-feira, 4 de abril de 2016

DIREITOS CULTURAIS x LEI DE INCENTIVO À CULTURA

Os direitos culturais, diferentemente de direitos sociais, ainda são pouco conhecidos pela grande maioria.

Desta maneira, na atual conjuntura política-social do país, estão surgindo ataques em relação aos artistas que utilizam as leis de incentivos à cultura (Lei Rouanet, Fundo de Cultura, Mecenato, etc.)

Precisamos deixar claro que nós artistas usufruímos do direito constitucional e trabalhamos em prol do Direito Cultural dos brasileiros:

  • Direito à identidade e à diversidade cultural (ou direito ao patrimônio cultural)
  • Direito à participação na vida cultural, que compreende:
    - Direito à livre criação;
    - Direito ao livre acesso;
    - Direito à livre difusão;
    - Direito à livre participação nas decisões de política cultural.
  • Direito autoral
  • Direito ao intercâmbio cultural (nacional e internacional)"

    (Plano Nacional de Cultura)

Queremos ressaltar, que a maioria dos artistas concordam que as leis de incentivo à cultura precisam ser reformuladas e melhoradas. Apesar disso, estas fazem parte dos mecanismos onde o governo se responsabiliza no fomento à cultura no país junto com os agentes culturais. Vejam o artigo 215 da nossa constituição:

Art. 215. O Estado garantirá a todos o pleno exercício dos direitos culturais e acesso às fontes da cultura nacional, e apoiará e incentivará a valorização e a difusão das manifestações culturais.

§ 1º - O Estado protegerá as manifestações das culturas populares, indígenas e afrobrasileiras, e das de outros grupos participantes do processo civilizatório nacional.

§ 2º - A lei disporá sobre a fixação de datas comemorativas de alta significação para os diferentes segmentos étnicos nacionais.

§ 3º A lei estabelecerá o Plano Nacional de Cultura, de duração plurianual, visando ao desenvolvimento cultural do País e à integração das ações do poder público que conduzem à:

I defesa e valorização do patrimônio cultural brasileiro;

II produção, promoção e difusão de bens culturais;

III formação de pessoal qualificado para a gestão da cultura em suas múltiplas dimensões;

IV democratização do acesso aos bens de cultura;

V valorização da diversidade étnica e regional.

Muitas pessoas podem achar desnecessário o investimento à cultura. Que não deveria conceder dinheiro a nós, agentes culturais. Porém, é importante entender que a cultura, incluindo a arte, faz parte da formação de um cidadão consciente do seu entorno e de sua realidade. Ela desenvolve a identidade de que habitamos um espaço e tempo em comum, a qual permite nos compartilhar os valores éticos, morais, estéticos, folclóricos, artísticos, religiosos, etc. Um processo que nos faz aprender a respeitar as múltiplas naturezas coexistentes, e ao mesmo tempo, encontrar algo que nos unifica como um povo - uma nação. Dessa maneira, a cultura faz parte da formação de um cidadão brasileiro.

Muitos dos problemas de falta de convivência, agressividade, violências vivenciados nas ruas atualmente são oriundos da falta de arte e cultura.

Somos os que lutam pelos espaços coletivos e públicos de convivências, pois isso é inerente ao fomento da arte/cultura. Aqueles que buscam assegurar os direitos culturais de todos. E acima de tudo, os que acreditam na proteção dos direitos humanos fundamentais através da democracia.

Só peço um pouco mais de empatia com todos - inclusive com nós artistas.

Yiuki Doi, trabalhador da dança

p.s. Lei Rouanet beneficia vários projetos com fins duvidáveis da cultura, além de fazer com que o mercado, empresas que vão patrocinar, ditem os rumos dos investimento à cultura. Vendo que mais de 60% da captações acontecem no Sul e Sudeste, e que há problema de distribuição financeira dos editais da Rouanet no país inteiro, todos vem questionando sobre esse formato de incentivo à cultura. Mas A LEI ROUANET NÃO É O PROPOSTA DO GOVERNO DO PT, ela existe desde 1991. O Sistema Nacional de Cultura, que visa a gestão, financiamento e planejamento cultural por meio da participação e controle social é um programa que o PT está implementando no Brasil desde o 1º Governo do Lula. Tenho algumas críticas ao processo lento, e tb da necessidade de maior verba para que abarquem todas os colegiados setoriais de cultura. Mas vale reconhecer que esse é o governo que mais tem cuidado com a democratização da cultura no país.


Referências:

terça-feira, 16 de fevereiro de 2016

Conferência Setorial de Dança de Curitiba (24 Fev 2016)

Conferência Setorial de Dança de Curitiba
Local: Casa Hoffmann
Data: 24 de Fevereiro
Horário: 19h às 21h (4ª feira)

Pauta: Discutir sobre o Plano Setorial de Dança de Curitiba.

Segue a planilha comparativa das diretrizes da Conferência de Cultura Municipal, Estadual e Nacional: https://goo.gl/p4mRPC

Também poderão contribuir para o plano postando comentários na planilha.

Aguardamos a presença de todos os agentes culturais.

Abraços.

Coordenadores da Setorial de Dança de Curitiba


Apoio ao reconhecimento das Artes como área na Base Nacional Comum Curricular – BNCC e consequentemente apoio à Dança como componente das Artes, e não subcomponente da Educação Física.

A TODOS OS PROFISSIONAIS DA ÁREA ARTÍSTICA

Nós, artistas,professores universitários e da Educação Básica, pesquisadores assim como as diferentes representações institucionais e públicas do campo da Arte vimos, por meio desta, manifestar nosso descontentamento e contrariedade frente ao fato de que no texto da Base Nacional Comum Curricular para o Ensino Básico brasileiro, o subcomponente curricular “Dança” ser incluído como um dos eixos fundamentais que compõem o componente curricular Educação Física a despeito de toda legislação que determina este conhecimento como pertencente à Arte.

Cabe-nos ressaltar que, às vésperas da divulgação deste documento preliminar para consultoria pública, a representante da Dança, que trabalha junto a outros especialistas na elaboração do referido documento, tentou exaustivamente e sem êxito negociar a retirada dos conteúdos de Dança do subcomponente Educação Física de modo que a margem para o diálogo tornou-se cada vez mais restrita.

Temos consciência da única justificativa apresentada pelos colegas do Componente Curricular Educação Física em defesa de tal prática: a tradição arraigada e o costume da inserção da dança em seus currículos.Entretanto observamos a inconsistência deste argumento tendo vista o fato de que nem todas as tradições são sustentáveis, racional ou epistemologicamente, na contemporaneidade ou, mesmo, desejadas. Tomemos por exemplo o racismo que também se enraizou como tradição arraigada em nosso país e, todavia,entendemos que deve ser combatido e não legitimado em sua inércia.

A tensão entre os colegas licenciados em Dança e aqueles licenciados em Educação Física tem um histórico de cerca de 15 anos na educação básica brasileira e denota um cunho político e de reserva de mercado de trabalho em prol da Educação Física que não podem mais ser negligenciados. Tivemos uma grande batalha contra o CONFEF – Conselho Federal de Educação Física que insistia em dominar o mercado de trabalho das academias de formação em dança através da imposição de que todos os professores de dança se filiassem ao CONFEF e para isto deveriam ser formados em educação física ou se “qualificar” num cursinho de três meses. Enfim, foi uma situação ameaçadora que mobilizou os profissionais em dança, incluindo a mobilização do congresso nacional, com o apoio de parlamentares que evitaram que o CONFEF invadisse o campo do ensino da dança.

Partindo das considerações acima colocadas, entendemos que, ainda que nas Diretrizes Curriculares do Curso de Educação Física, aprovadas pelo CNE, conste a dança como disciplina não obrigatória que pode ser cursada ao longo da graduação; as Diretrizes Curriculares Nacionais - documento que não apenas normatiza a educação básica, mas que deve balizar a Base Nacional Curricular Comum (BNCC) - alocam a dança no Componente curricular Arte em todas as passagens em que aparece, desde a Educação Infantil ao Ensino Médio,a saber, nas páginas 99, 114, 133, 450, 484, 505 e 506 das referidas Diretrizes.

O fato de que a Educação Física preveja a Dança como um de seus conteúdos nas Diretrizes Curriculares de seus cursos de graduação não é elemento que balize de forma consistente a transformação da Dança em subcomponente para viabilizar seu ensino na Educação Básica atrelado ao componente curricular Educação Física, uma vez que as Diretrizes Curriculares Nacionais são claras em relação a esse tópico. A Dança é subcomponente pertencente ao componente curricular Arte.

Soma-se a isso o fato de que a Educação Física, a despeito da exigência do PNE, ainda não tem diretrizes curriculares específicas para a licenciatura; deste modo os profissionais da Educação Física não se reportam ao MEC, mas sim ao Conselho Federal de Educação Física (CONFEF); já os cursos de licenciatura em Dança – bem como seu exercício profissional e as questões relativas à sua disciplina - são subordinados – como no caso de outras licenciaturas – ao MEC, o que representa um claro ganho à educação.

Importante salientar que existem hoje no Brasil 35 cursos de Licenciatura em Dança reconhecidos pelo MEC, cujo eixo principal de seus currículos é especificamente o ensino da Dança na Educação Básica. O mesmo não se procede em relação à Educação Física. Se observarmos, por exemplo, as matrizes curriculares dos cursos de Licenciatura em Educação Física no país, fica claro que a Dança constitui, na grande maioria dos cursos, somente uma disciplina em meio a um período de 4 anos de formação.  Vejamos:

  1. Atualmente, na matriz curricular do curso de Licenciatura em Educação Física da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), a disciplina “Danças”, é  oferecida no 2º período, com carga horária de 45h. Essa é a única disciplina oferecida em toda formação do futuro professor de Educação Física.
  2. No curso de Licenciatura em Educação Física da Universidade Federal de Goiás, a Dança nem sequer é elencada como disciplina na matriz curricular. 
  3. O mesmo acontece com a Licenciatura em Educação Física da Universidade Federal da Bahia. 

Situação bem diferente pode ser percebida nas matrizes curriculares dos cursos de Licenciatura em Dança, em que quase a totalidade da carga horária da formação do futuro professor de Dança é ocupada com disciplinas que tratam dos diferentes estilos de dança (dança moderna, contemporânea, danças brasileiras, entre outras), problematizando seu ensino e a inserção deste no contexto da Educação Básica.

Nessa perspectiva, constata-se que a Dança, como subcomponente do componente curricular Arte, já vem consolidando um percurso de formação de professores para atuarem na Educação Básica de forma crítica, reivindicando para si sua especificidade como prática artística e cultural pertencente ao entendimento da Arte como campo de conhecimento que deve ter suas especificidades e importância respeitadas na escola como campo específico e singular de construção de saber.

Cabe-nos considerar que o fato de uma disciplina estar inserida em um curso não torna seu egresso especialista no conhecimento em pauta, mas apenas o alija da condição absoluta de leigo. Não fosse assim, poderíamos admitir que qualquer professor de ensino básico, de qualquer área de conhecimento, poderia clinicar em consultórios de Psicologia Infantil tendo em vista o fato de que cursou a disciplina de psicologia na formação universitária.

Desse modo, é notório que a Licenciatura em Educação Física não oferece a mínima formação necessária para que seu egresso possa atuar de forma consistente no ensino de Dança que pressuporia conhecimento de conceitos específicos concernentes à dança como forma estética, contextualização dessas diferentes práticas de Dança numa perspectiva crítica e sensível, criação em Dança, investigação da Dança em suas diferentes matrizes expressivas etc. Como fazer isso de forma consistente com uma única disciplina de Dança em sua formação? E nos casos apresentados da ausência de qualquer disciplina de Dança?

Com esta realidade em cena, cabe-nos lembrar que o Colegiado Setorial da Dança, órgão vinculado ao Ministério da Cultura, elaborou o Plano Setorial da Dança, de âmbito nacional e que integra o Sistema Nacional de Cultura. Este plano fixou diretrizes para orientar a implementação de políticas públicas para o ensino da Dança em todo o país. Dentre outras coisas, o documento diz:

3.1.3. Implementar instrumentos jurídicos e legais que assegurem a inclusão do ensino da dança nos currículos do ensino básico de todas as escolas públicas e privadas. (Médio e longo prazo / Meta: 100% de docentes contratados para a área com Licenciatura em Dança).

A este propósito queremos considerar a reunião recente – de agosto de 2015 – que teve como tema "Encontro sobre Arte e Cultura no Currículo” - na qual foi firmado acordo, sob a forma de Portaria Interministerial Minc/MEC, entre o Ministro da Educação, Renato Janine, e o Ministro da Cultura, Juca Ferreira, contando com a presença do Secretário da Educação Básica, Manuel Palácios, que estabelece a inserção de forma autônoma, e com suas especificidades respeitadas, da Arte e da Cultura nos currículos da Educação Básica.  Este acordo teve a Base Nacional Curricular Comum como uma se suas pautas.

Nessa perspectiva, apresentamos nosso repúdio ao fato de o documento preliminar da Base Nacional Comum Curricular ir para a consulta pública com este equívoco que contraria uma portaria interministerial, o plano setorial e todo o investimento público na criação dos cursos de licenciatura em Dança, além de atropelar o campo de conhecimento em Artes.

Desse modo, nós artistas, professores e pesquisadores e as diferentes representações institucionais e públicas do campo da Arte, não podemos legitimar, pelo silêncio, um documento que claramente desrespeita e prejudica a Arte como campo de conhecimento e como componente curricular e mais especificamente a Dança como subcomponente desta, fingindo desconhecimento e furtando-se a declarar abertamente uma posição em relação a essa disputa política e reserva de mercado dos profissionais da Educação Física na incorporação da Dança para si.

Arnaldo Alvarenga, bailarino, coreógrafo, pesquisador e professor do Curso de Licenciatura em Dança da UFMG.